quarta-feira, 27 de maio de 2009

Já era!

Analisar um jornal voltado para as classes C e D de Campinas e região parecia, de início, uma missão relativamente simples. Mas devo admitir que algumas pedras apareceram no caminho, e a tarefa de escrever sobre o “Notícia Já”, jornal diário da Rede Anhanguera de Comunicação, foi bem mais difícil do que enfrentar a árdua leitura de páginas escritas com “linguagem popular”.

O primeiro problema apareceu antes mesmo de ter o jornal em mãos: é impossível encontrá-lo em qualquer banca de revistas da cidade. Os únicos pontos de venda são pessoas contratadas pela empresa para que penduram em seus ombros quilos e mais quilos do diário para vendê-los por ônibus circulares e bairros da periferia da cidade. Resumo da obra: eu teria de andar de circular às 7 da manhã para comprar o bendito!

Mas meu santo é forte. Ou pelo menos foi por um dia. Depois de vasculhar por algumas bancas, voltei desiludido para casa. Mas, lá aconteceu o milagre: a edição do dia do Já estava na mesa da cozinha, esperando pela minha chegada. Calma, não foi um milagre de verdade. O fato é que a empregada doméstica que trabalha na minha casa compra o jornal todos os dias na vinda para o trabalho. Não é que eu fui descobrir um estoque do bendito jornal em casa?

Bem, superado o problema inicial, me defrontei com outro logo nos segundos iniciais de leitura, quando li as chamadas de capa. Deixando toda a masculinidade de lado, levei um susto com a frase de destaque. “Samurai gay mata namorado com espada” era ela. Podem admitir, eu sei que se assustaram também. Não é só a retratação absolutamente esdrúxula dos personagens que assusta, mas também a violência do ato narrado. Depois chamam a Veja de sensacionalista.

Mas não parou por aí. A grande maioria das chamadas da capa falava de violência, estupros, seqüestros e assassinatos da mesma forma que a frase principal. Imaginem só se o Já existisse na época em que assassinaram o Kennedy: “ Retardado mental enfia bala na cabeça do presidente comedor de Mc Donald’s”. Lamentável. E as matérias seguiam nos mesmos moldes dos títulos: com caracterizações completamente desrespeitosas das fontes e uma linguagem muito próxima daquela que é falada pelo público alvo do veículo.

Já ouvi alguns elogios para esse jornal. Pessoas dizendo que ele está fazendo as “informações” chegarem a todas as classes. Eu acho que algumas pessoas confundem informações com carnificina e mulheres saradas.

Quase na mesma proporção da chamada principal, uma foto de uma modelo loira seminua ilustrava a capa. Em todas as edições uma bonitona é mostrada na primeira página. Faz parte de um projeto do jornal feito para fazer a informação chegar às classes baixas chamado “Gostosa do Dia”. Se tamanho de bumbum fosse quantidade de informação, eles deveriam ganhar o prêmio Pulitzer.

Mas e aquelas que não conseguem o título de gostosa da semana? Podem ficar tranqüilas, tem espaço para vocês também. É só mandar para o jornal uma foto de biquíni e segurando um guarda-chuva que vocês devem sair em uma das sessões: a previsão do tempo. É isso mesmo: todas as temperaturas e previsões ficam ao lado da mulher do tempo do dia.

É por isso que concordo quando dizem que brasileiro é criativo, malandro, dá seu “jeitinho” em tudo. Enquanto a educação brasileira não dá condições mínimas para alfabetizar a população e muito menos para formar leitores com algum senso crítico, alguns malandros brasileiros se aproveitam para adequar os veículos de comunicação às tendências do mercado.

É rir para não chorar.

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